Escritório alcança vitória para adequar o valor da reparação econômica de anistiado político da Companhia Siderúrgica Nacional.
Segue abaixo o acórdão com essa conquista do escritório Torreão, Machado e Linhares Dias:
“CONSTITUCIONAL. CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAL E MATERIAL. UNIÃO. PERSEGUIÇÃO POLÍTICA. ANISTIA. REPARAÇÃO ECONÔMICA EM PARCELA MENSAL, PERMANENTE E CONTINUADA. LEI N. 10.559/2002. VALOR DA INDENIZAÇÃO. CRITÉRIO A SER OBSERVADO. INFORMAÇÃO PRESTADA POR ENTIDADE SINDICAL. PRESCRIÇÃO DO FUNDO DE DIREITO. INOCORRÊNCIA. PREJUDICIAL REJEITADA. RETROATIVIDADE DO VALOR INDENIZATÓRIO. ALCANCE. APELAÇÃO DO AUTOR, PROVIDA EM PARTE. TUTELA DE URGÊNCIA. PEDIDO INDEFERIDO. ART. 100, § 1º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. ART. 85, § 3º, INCISO I, DO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC).
- O Superior Tribunal de Justiça (STJ) consagrou o entendimento de que, “em casos em que se postula a defesa de direitos fundamentais”, como na hipótese, de indenização por danos morais “decorrentes de atos de tortura por motivo político”, não se aplica a regra do Decreto n. 20.910/1932, o qual “é para situações de normalidade”, devendo, no caso, prevalecer a imprescritibilidade. Ademais, a Lei n. 10.536/2002 ampliou o prazo de abrangência da Lei n. 9.140/1995, reabrindo o prazo para que os parentes das vítimas pleiteassem indenização do Estado.
- Este Tribunal, ao apreciar situação idêntica, já manifestou o entendimento de que o art. 1º do Decreto n. 20.910/1932 é aplicável apenas em relação às prestações vencidas no prazo de 5 (cinco) anos, antecedentes à propositura da ação, e não ao próprio fundo de direito, porquanto a publicação da Lei n. 10.559/2002 implicou renúncia tácita à prescrição.
- O art. 6º da Lei n. 10.559/2002 fixou os critérios a serem observados para a obtenção do valor devido a título de prestação mensal, permanente e continuada.
- A Comissão de Anistia, ao fixar o valor da aludida pensão, tomou por parâmetro “os valores salariais dos soldadores da indústria informados pelo Instituto Econômico (Datafolha), que monitora o mercado de trabalho oficial” (fl. 152). Ao assim proceder, contudo, acabou por afrontar expressa disposição da Lei n. 10.559/2002, diante da existência de informação fornecida pelo órgão sindical, que foi desconsiderada. Precedente.
- No que se refere à retroatividade dos efeitos da reparação econômica, deve ser considerada a data estabelecida pela própria Comissão de Anistia, 12.01.1989, em conformidade com o art. 6º, § 6º, da Lei 10.559/2002, que limitou os efeitos da reparação econômica, estabelecendo como início da retroatividade e da prescrição quinquenal a data do protocolo da petição ou requerimento inicial de anistia (AC n. 0023640-57.2011.4.01.3500/GO, Relator Desembargador Federal Néviton Guedes, Relatora Convocada Juíza Federal Daniele Maranhão Costa, e-DJF1 de 13.07.2016).
- Pedido de concessão da tutela de urgência que se indefere. De acordo com o art. 300 do novo CPC a tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. Na hipótese, não estão configurados o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo, considerando que o autor já foi beneficiado pela decisão administrativa, por mérito da qual percebe os valores indenizatórios então determinados. Além disso, é notório que a União detém capacidade de solvência e seus débitos estão sujeitos ao regime de precatório (art. 100, § 1º, da Constituição Federal).
- Honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do art. 85, § 3º, inciso I, do CPC de 2015, visto que o autor decaiu de parte mínima do pedido.
- Apelação parcialmente provida.
A C Ó R D Ã O
Decide a 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação do autor.
Brasília, 28 de maio de 2018.
Des. Federal DANIEL PAES RIBEIRO
Relator
R E L A T Ó R I O
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL DANIEL PAES RIBEIRO:
Trata-se de recurso de apelação interposto por [omitido] em face de sentença que declarou a prescrição do próprio fundo de direito, referente à pretensão do autor em obter o reajuste dos valores da prestação mensal, permanente e continuada decorrente do reconhecimento da sua condição de anistiado político pela Comissão de Anistia do Ministério da Justiça.
A ilustre magistrada sentenciante aplicou à hipótese o art. 1º do Decreto n. 20.910/1932, ao fundamento de que decorreram mais de 5 (cinco) anos desde que foi editado o ato de concessão de anistia do qual resultou o recebimento da aludida pensão mensal.
Concluiu que está configurada, no caso em apreço, pretensão de ampliação dos efeitos pecuniários do ato de concessão da anistia, o que equivale à revisão do próprio ato de anistia, razão por que está atingido pelo lapso prescricional o pedido formulado judicialmente em 05.08.2016, considerando-se que a decisão da Comissão de Anistia foi proferida em 07.05.2009 e publicada por intermédio da Portaria n. 2.403/2009 (fls. 192-194).
Em suas razões (fls. 197-214), o apelante afirma que, nos termos do art. 8º, caput, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, a questão versada nesta lide não é atingida pela prescrição, por estar relacionada à tutela de direitos fundamentais.
Aduz que a jurisprudência pátria tem entendido que a publicação da Lei n. 10.559/2002 implicou renúncia tácita à prescrição, devendo ser considerado que o art. 11 da referida norma autoriza seja pleiteada a revisão da prestação mensal a qualquer tempo.
Esclarece, em relação ao mérito, que o valor da aludida prestação deve obedecer às disposições constantes dos artigos 6º, caput, §§ 1º, 2º, 4º e 7º, da Lei n. 10.559/2002, devendo prevalecer as informações fornecidas pelo sindicato a que estava filiado no período em que exerceu suas atividades junto à Companhia Siderúrgica Nacional.
Requer, ao final, a antecipação da tutela disciplinada pelo art. 300 do Código de Processo Civil de 2015.
A União ofereceu suas contrarrazões (fls. 216-222, frente e verso).
Os pedidos de gratuidade da justiça e de preferência no trâmite processual em razão da idade do autor foram deferidos (fl. 156).
É o relatório.
Des. Federal DANIEL PAES RIBEIRO
Relator
V O T O
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL DANIEL PAES RIBEIRO:
O apelante busca modificar a sentença que declarou a prescrição do fundo de direito mediante a aplicação, na hipótese, do art. 1º do Decreto n. 20.910/1932, extinguindo o processo com resolução de mérito, nos termos do art. 487, inciso II, do Código de Processo Civil de 2015.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) consagrou o entendimento de que, “em casos em que se postula a defesa de direitos fundamentais”, como na hipótese, de indenização por danos morais “decorrentes de atos de tortura por motivo político”, não se aplica a regra do Decreto n. 20.910/1932, o qual “é para situações de normalidade”, devendo, no caso, prevalecer a imprescritibilidade. Ademais, a Lei n. 10.559/2002 ampliou o prazo de abrangência da Lei n. 9.140/1995, reabrindo o prazo para que os parentes das vítimas pleiteassem indenização do Estado.
Em amparo ao posicionamento adotado, colaciono o seguinte julgado proferido pelo STJ:
PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. INDENIZAÇÃO. REPARAÇÃO DE DANOS MORAIS. REGIME MILITAR. PERSEGUIÇÃO E PRISÃO POR MOTIVOS POLÍTICOS. IMPRESCRITIBILIDADE. DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. INAPLICABILIDADE DO ART. 1.º DO DECRETO N.º 20.910/32. ESGOTAMENTO DA VIA ADMINISTRATIVA. OFENSA A DISPOSITIVOS CONSTITUCIONAIS. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. DANOS MORAIS. INDENIZAÇÃO. CONFIGURAÇÃO, REDUÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO E HONORÁRIOS. MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA. SÚMULA N.º 07/STJ.
- Ação ordinária proposta com objetivo de reconhecimento de danos morais, em face do Estado, pela prática de atos ilegítimos decorrentes de perseguições políticas perpetradas por ocasião do golpe militar de 1964, que culminaram na prisão do genitor dos ora autores, cujas consequências, alegam os requerentes, ocasionaram transtornos depressivos na vítima e dependência alcoólica, bem como discriminação no ambiente social dos autores e debilidade das condições financeiras.
- O prévio requerimento na via administrativa, como fundamento para postular a via judicial, sob pena de falta de condição da ação, qual seja, o interesse de agir, ao aduzir ofensa à Medida Provisória nº 65, a qual regulamentou o art. 8º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, não se revela apto a ensejar a abertura desta via especial.
- Deveras, revela-se a ofensa ao dispositivo constitucional não passível de apreciação em sede de recurso especial.
- A violação aos direitos humanos ou direitos fundamentais da pessoa humana, como sói ser a proteção da sua dignidade lesada pela tortura e prisão por delito de opinião durante o Regime Militar de exceção enseja ação de reparação ex delicto imprescritível, e ostenta amparo constitucional no art. 8.º, § 3.º, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.
- À luz das cláusulas pétreas constitucionais, é juridicamente sustentável assentar que a proteção da dignidade da pessoa humana perdura enquanto subsiste a República Federativa, posto seu fundamento.
- Consectariamente, não há falar em prescrição da pretensão de se implementar um dos pilares da República, máxime porque a Constituição não estipulou lapso prescricional ao direito de agir, correspondente ao direito inalienável à dignidade.
- Outrossim, a Lei n.º 9.140/95, que criou as ações correspondentes às violações à dignidade humana, perpetradas em período de supressão das liberdades públicas, previu a ação condenatória no art. 14, sem cominar prazo prescricional, por isso que a lex specialis convive com a lex generalis , sendo incabível qualquer aplicação analógica do Código Civil ou do Decreto n.º 20.910/95 no afã de superar a reparação de atentados aos direitos fundamentais da pessoa humana, como sói ser a dignidade retratada no respeito à integridade física do ser humano.
- À lei interna, adjuntam-se as inúmeras convenções internacionais firmadas pelo Brasil, como, v.g., Declaração Universal da ONU, Convenção contra a Tortura adotada pela Assembléia Geral da ONU, a Convenção Interamericana contra a Tortura, concluída em Cartagena, e a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica).
- A dignidade humana violentada, in casu, posto ter decorrido, consoante noticiado pelos autores da demanda em sua exordial, de perseguição política imposta ao seu genitor, prisão durante o Regime Militar de exceção, revelando-se referidos atos como flagrantes atentados aos mais elementares dos direitos humanos, que segundo os tratadistas, são inatos, universais, absolutos, inalienáveis e imprescritíveis.
- A exigibilidade a qualquer tempo dos consectários às violações dos direitos humanos decorre do princípio de que o reconhecimento da dignidade humana é fundamento da liberdade, da justiça e da paz, razão por que a Declaração Universal inaugura seu regramento superior estabelecendo no art. 1.º que “todos os homens nascem livres e iguais em dignidade e direitos”.
- Deflui da Constituição Federal que a dignidade da pessoa humana é premissa inarredável de qualquer sistema de direito que afirme a existência, no seu corpo de normas, dos denominados direitos fundamentais e os efetive em nome da promessa da inafastabilidade da jurisdição, marcando a relação umbilical entre os direitos humanos e o direito processual.
- A responsabilidade estatal, consoante a legislação infraconstitucional (art. 186 do Código Civil) e à luz do art. 37 § 6º da CF/1988, resta inequívoca, bem como escorreita a imputação da indenização fixada a título de danos morais. A análise da existência do fato danoso, e o necessário nexo causal entre a suposta conduta omissiva e os prejuízos decorrentes da mesma implica em análise fático-probatória, razão pela qual descabe a esta Corte Superior referida apreciação em sede de recurso especial, porquanto é-lhe vedado atuar como Tribunal de Apelação reiterada ou Terceira Instância revisora, ante a ratio essendi da Súmula n.º 07/STJ. Precedentes: AgRg no REsp 723893/RS DJ 28.11.2005; AgRg no Ag 556897/RS DJ 09.05.2005; REsp 351764/RJ DJ 28.10.2002.
- In casu, o acórdão recorrido assentou que: A parte autora acosta aos autos à fl. 40, cópia autenticada pelo Arquivo Público do Paraná da Ficha Provisória Individual da Delegacia de Ordem Política e Social, onde consta no verso a seguinte informação: “Em, 9/6/64 – O fichado, por determinação da Comissão de IPM da 5ª Reg. Militar, foi apresentado preso, procedente de Rolândia, neste Estado, sendo recolhido ao Quartel da PME., à disposição da mesma comissão, acusado de ações subversivas, conforme of. N. 526/64, da 12ª Sub-Divisão Policial com sede em Londrina. (Vide documento arquivado na pasta de of. Recebidos). 20.Fev.67 – Em 29/6/_4, o fichado foi posto em liberdade.”A dignidade humana violentada, in casu, decorreu da prisão ilegal do genitor dos autores, realizado sem qualquer comunicação à família, gerando aflição aos autores e demais familiares, os quais desconheciam o paradeiro e destino de Álvaro Cabral, gerando suspeitas de que, por motivos políticos, poderia estar sendo torturado, revelando flagrante atentado ao mais elementar dos direitos humanos, os quais, segundo os tratadistas, são inatos, universais , absolutos , inalienáveis e imprescritíveis .(fls. 170/171)
- O quantum indenizatório devido a título de danos morais deve assegurar a justa reparação do prejuízo sem proporcionar enriquecimento sem causa do autor, além de levar em conta a capacidade econômica do réu, devendo ser arbitrado pelo juiz de maneira que a composição do dano seja proporcional à ofensa, calcada nos critérios da exemplariedade e da solidariedade 15. In casu, o Tribunal a quo considerando a responsabilidade objetiva do Estado, tendo em vista o fato da vítima ter sofrido perseguições políticas decorrente do regime militar de 1964, ocasionando depressão e dependência alcoólica, bem como sérias dificuldades financeiras na família e transtornos psicológicos no ambiente escolar, manteve o valor fixado em sentença, a título de danos morais em R$ 100.000,00 (cem mil reais).
- A modificação do quantum arbitrado a título de danos morais somente é admitida, em sede de recurso especial, na hipótese de fixação em valor irrisório ou abusivo, inocorrentes no caso sub judice.
- Precedentes jurisprudenciais desta Corte: RESP 681482/MG; Rel. Min. JOSÉ DELGADO, Relator(a) p/ Acórdão Min. LUIZ FUX, DJ de 30.05.2005; AG 605927/BA, Relatora Ministra Denise Arruda, DJ de 04.04.2005; AgRg AG 641166/RS, Relatora Ministra Nancy Andrighi, DJ de 07.03.2005; AgRg no AG 624351/RJ, Relator Ministro Jorge Scartezzini, DJ de 28.02.2005; RESP 604801/RS, Relatora Ministra Eliana Calmon, DJ de 07.03.2005; RESP 530618/MG, Relator Ministro Aldir Passarinho Júnior, DJ de 07.03.2005; AgRg no AG 641222/MG, Relator Ministro Fernando Gonçalves, DJ de 07.03.2005 e RESP 603984/MT, Relator Ministro Francisco Falcão, DJ de 16.11.2004.
- Os honorários advocatícios, nas causas em que for vencida a Fazenda Pública, devem ser fixados à luz do § 4º do CPC que dispõe, verbis: “Nas causas de pequeno valor, nas de valor inestimável, naquelas em que não houver condenação ou for vencida a Fazenda Pública, e nas execuções, embargadas ou não, os honorários serão fixados consoante apreciação equitativa do juiz, atendidas as normas das alíneas a, b e c do parágrafo anterior.”
- Conseqüentemente, a conjugação com o § 3.º do art. 20 do CPC é servil para a aferição equitativa do juiz, consoante às alíneas a, b e c do dispositivo legal. Deveras, assentou o Tribunal a quo: que a fixação dos honorários advocatícios em 10% do valor da condenação atende os critérios do art. 20, par. 3º, do CPC. (fls. 172)
- A revisão do critério adotado pela Corte de origem, por eqüidade, para a fixação dos honorários, encontra óbice na Súmula 07 do STJ. No mesmo sentido, o entendimento sumulado do Pretório Excelso: “Salvo limite legal, a fixação de honorários de advogado, em complemento da condenação, depende das circunstâncias da causa, não dando lugar a recurso extraordinário.” (Súmula 389/STF – Precedentes da Corte: REsp n.º 779.524/DF, Rel. Min. Francisco Peçanha Martins, DJU de 06/04/2006; REsp 726.442/RJ, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, DJU de 06/03/2006; AgRg nos EDl no REsp 724.092/PR, Rel. Min. Denise Arruda, DJU de 01/02/2006).
- Os embargos de declaração que enfrentam explicitamente a questão embargada não ensejam recurso especial pela violação do artigo 535, II, do CPC, tanto mais que, o magistrado não está obrigado a rebater, um a um, os argumentos trazidos pela parte, desde que os fundamentos utilizados tenham sido suficientes para embasar a decisão.
- Recurso Especial parcialmente conhecido, e na parte conhecida,
desprovido.
(STJ: REsp n. 959904/PR – Relator Ministro Luiz Fux – DJe de 29.09.2009)
Este Tribunal, ao apreciar situação idêntica, já manifestou o entendimento de que o art. 1º do Decreto n. 20.910/1932 é aplicável apenas em relação às prestações vencidas no prazo de 5 (cinco) anos, antecedentes à propositura da ação, e não ao próprio fundo de direito, porquanto a publicação da Lei n. 10.559/2002 implicou renúncia tácita à prescrição.
Confira-se, a propósito, o julgado a seguir transcrito:
ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL. CIVIL. ANISTIA. FALTA DE INTERESSE DE AGIR. INOCORRÊNCIA. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO REVISIONAL DA PRESTAÇÃO MENSAL, PERMANENTE E CONTINUADA. APLICAÇÃO DO ART. 11 DA LEI 10.559/02, COMBINADA COM O ART. 1º DO DECRETO Nº 20910/32 E SÚMULA 85 DO STJ. FIXAÇÃO DA PRESTAÇÃO. EMPREGO EQUIVOCADO. NECESSIDADE DE CORREÇÃO PARA TER COMO BASE DE CÁLCULO O EMPREGO OCUPADO QUANDO DE SUA DEMISSÃO, CONSIDERANDO AS EVOLUÇÕES DA CARREIRA DA MÉDIA DAQUELES QUE NÃO FORAM DEMITIDOS. BENEFÍCIOS INDIRETOS. ART. 14 DA LEI 10.559/02. INEXISTÊNCIA. HONORÁRIOS CONTRATUAIS. RESSARCIMENTO PELA PARTE ADVERSA. IMPOSSIBILIDADE. RECURSO DE APELAÇÃO E REEXAME NECESSÁRIO A QUE SE DÁ PARCIAL PROVIMENTO.
- Quanto à questão preliminar arguida pela União, relativa à falta de interesse processual do autor, uma vez que seu pedido já teria sido devidamente analisado no âmbito administrativo, não cabendo ao Poder Judiciário sua revisão, não merece prosperar, pois de acordo com o disposto no art. 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal, tem-se que: “XXXV – a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”. É de se ressaltar, por oportuno, existir independência entre as instâncias administrativa e judiciária.
- Em relação à prescrição, conjugando o art. 11 da Lei nº 10.559/02, com o art. 1º do Decreto nº 20.910/32 e a Súmula 85 do STJ, a interpretação resultante sobre a prescrição no presente caso é de que, se eventualmente reconhecida a revisão dos valores fixados a título de reparação indenizatória decorrente de anistia política, ela alcançará apenas as parcelas pagas ao autor nos cinco anos que precederam a propositura da presente demanda, prescrevendo a revisão relativa às prestações mensais pagas anteriormente ao citado período. Precedente.
III. À luz do que dispõe o art. 6º, § 4º, anteriormente transcrito, devem ser considerados para fixação da prestação mensal, permanente e continuada do autor os ganhos de Operador Especialista, decorrente da evolução funcional mais comum entre os que ocupavam, assim como ele, o cargo de Operador Industrial I à época de sua demissão, e não o de “vigia”, como fizera a Comissão. Precedente.
- Quanto aos benefícios indiretos a serem prestados ao autor, devem ser aqueles existentes do momento em que o autor fora demitido, conforme prescreve o art. 14 da Lei nº 10.559/02. No entanto, não logrou o autor comprovar que faria jus a tais benefícios, já que não há nos autos informação acerca da sua existência quando de sua demissão, razão pela qual não devem a ele ser concedidos, uma vez que não se desincumbiu do ônus presente no art. 333, inciso do CPC. Precedente.
- Por fim, quanto aos honorários contratuais fixados à fl. 1591-verso pelo magistrado de primeira instância, não devem prevalecer. Isso porque o simples fato de a parte contratar advogado para exercício de direito não enseja por si só dano material passível de indenização. Ademais, não possui a parte adversa do autor da demanda qualquer relação jurídica com o patrono do autor a ensejar-lhe o dever de arcar com honorários advocatícios firmados contratualmente, de forma particular e subjetiva. Precedentes.
- Apelação e reexame necessário a que dá parcial provimento (Itens IV e V).
(AC n. 0020289-51.2012.4.01.3400/DF – Relator Desembargador Federal Jirair Aram Meguerian – e-DJF1 de 16.11.2015, p. 795)
Extraio do precedente mencionado o seguinte trecho, porque elucidativo para a solução da lide:
No caso, porém, o autor já é beneficiário da prestação mensal continuada; o que pretende, grosso modo, é a revisão do benefício.
De acordo com o disposto no art. 11, parágrafo único, da Lei nº 10.559/02, tem-se que o valor da prestação continuada poderá ser revisto a qualquer tempo, desde que não tenha sido arbitrado de acordo com o disposto nos artigos 6º e seguintes do mencionado diploma, como se nota a seguir:
“Parágrafo único. O anistiado político ou seu dependente poderá solicitar, a qualquer tempo, a revisão do valor da correspondente prestação mensal, permanente e continuada, toda vez que esta não esteja de acordo com os arts. 6o, 7o, 8o e 9o desta Lei.” (negritei)
Assim, tem-se que o pleito revisional pode ser formulado a qualquer tempo, desde que tenha por objetivo enquadramento do ato administrativo de sua concessão aos critérios legalmente previstos.
Contudo, não se pode olvidar da aplicação do disposto no art. 1º, do Decreto nº 20.910/32, in verbis:
“Art. 1º As dívidas passivas da União, dos Estados e dos Municípios, bem assim todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda federal, estadual ou municipal, seja qual for a sua natureza, prescrevem em cinco anos contados da data do ato ou fato do qual se originarem.” (negritei)
Conjugando os dois dispositivos transcritos, a interpretação resultante sobre a prescrição no presente caso é de que, se eventualmente reconhecida a revisão dos valores fixados a título de reparação indenizatória decorrente de anistia política, ela alcançará apenas as parcelas pagas ao autor nos cinco anos que precederam a propositura da presente demanda, prescrevendo a revisão relativa às prestações mensais pagas anteriormente ao citado período.
Logo, não pode prevalecer o entendimento que aplicou o prazo prescricional ao fundo de direito.
Constatado que os autos se encontram satisfatoriamente instruídos, passo ao exame do mérito, nos termos do art. 1.013, § 4º, do CPC.
A Lei n. 10.559/2002 dispôs acerca do valor a ser considerado para fins de prestação mensal, permanente e continuada:
Art. 6º O valor da prestação mensal, permanente e continuada, será igual ao da remuneração que o anistiado político receberia se na ativa estivesse, considerada a graduação a que teria direito, obedecidos os prazos para promoção previstos nas leis e regulamentos vigentes, e asseguradas as promoções ao oficialato, independentemente de requisitos e condições, respeitadas as características e peculiaridades dos regimes jurídicos dos servidores públicos civis e dos militares, e, se necessário, considerando-se os seus paradigmas.
- 1º O valor da prestação mensal, permanente e continuada, será estabelecido conforme os elementos de prova oferecidos pelo requerente, informações de órgãos oficiais, bem como de fundações, empresas públicas ou privadas, ou empresas mistas sob controle estatal, ordens, sindicatos ou conselhos profissionais a que o anistiado político estava vinculado ao sofrer a punição, podendo ser arbitrado até mesmo com base em pesquisa de mercado.
- 2º Para o cálculo do valor da prestação de que trata este artigo serão considerados os direitos e vantagens incorporados à situação jurídica da categoria profissional a que pertencia o anistiado político, observado o disposto no § 4º deste artigo.
- 3º As promoções asseguradas ao anistiado político independerão de seu tempo de admissão ou incorporação de seu posto ou graduação, sendo obedecidos os prazos de permanência em atividades previstos nas leis e regulamentos vigentes, vedada a exigência de satisfação das condições incompatíveis com a situação pessoal do beneficiário.
- 4º Para os efeitos desta Lei, considera-se paradigma a situação funcional de maior freqüência constatada entre os pares ou colegas contemporâneos do anistiado que apresentavam o mesmo posicionamento no cargo, emprego ou posto quando da punição.
Art. 7º O valor da prestação mensal, permanente e continuada, não será inferior ao do salário mínimo nem superior ao do teto estabelecido no art. 37, inciso XI, e § 9o da Constituição.
- 1º Se o anistiado político era, na data da punição, comprovadamente remunerado por mais de uma atividade laboral, não eventual, o valor da prestação mensal, permanente e continuada, será igual à soma das remunerações a que tinha direito, até o limite estabelecido no caput deste artigo, obedecidas as regras constitucionais de não-acumulação de cargos, funções, empregos ou proventos.
- 2º Para o cálculo da prestação mensal de que trata este artigo, serão asseguradas, na inatividade, na aposentadoria ou na reserva, as promoções ao cargo, emprego, posto ou graduação a que teria direito se estivesse em serviço ativo.
Art. 8º O reajustamento do valor da prestação mensal, permanente e continuada, será feito quando ocorrer alteração na remuneração que o anistiado político estaria recebendo se estivesse em serviço ativo, observadas as disposições do art. 8o do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.
Art. 9º Os valores pagos por anistia não poderão ser objeto de contribuição ao INSS, a caixas de assistência ou fundos de pensão ou previdência, nem objeto de ressarcimento por estes de suas responsabilidades estatutárias.
Parágrafo único. Os valores pagos a título de indenização a anistiados políticos são isentos do Imposto de Renda.
Ao que se extrai da documentação juntada aos autos, a condição de anistiado político foi reconhecida ao autor por intermédio da Portaria n. 2403/2009, oportunidade em que foi fixada pensão mensal (fl. 154), permanente e continuada no valor de R$ 1.957,00 (mil novecentos e cinquenta e sete reais), com efeitos retroativos à data do julgamento em 07.05.2009 a 12.01.1989, perfazendo um total de R$ 516.974,71 (quinhentos e dezesseis mil, novecentos e setenta e quatro reais e setenta e um centavos).
O demandante inconforma-se com o valor final a que chegou a Comissão de Anistia por entender que não foi observada a determinação inscrita no art. 6º, §§ 1º, 2º e 4º da norma acima transcrita, visto que a Comissão de Anistia não levou em consideração a progressão funcional informada pelo Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias Metalúrgicas, Mecânicas, de Material Elétrico, de Material Eletrônico e de Informática de Volta Redonda, Barra Mansa, Resende, Itatiaia, Quatis, Porto Real e Pinheiral (fls. 140-143).
Tem razão o apelante. Segundo informação prestada pela entidade sindical, ao ser demitido, o anistiado ocupava o cargo de Mecânico Nível 09, Padrão 35, de modo que se permanecesse na ativa, considerando que sua demissão ocorreu no ano de 1987, estaria, conforme maior frequência apurada na empresa, na condição de Chefe de Divisão ou Coordenador, hoje equivalente ao cargo de Supervisor de Mecânica II, que alcança a importância de R$ 3.568,09 (três mil quinhentos e sessenta e oito reais e nove centavos), devendo ser levado em consideração, ainda, o valor vinculado à Participação nos Lucros e Resultados apurado no ano de 2003, no total de R$ 5.752,44 (fl. 142).
A Comissão de Anistia, ao fixar o valor da pensão, tomou por parâmetro “os valores salariais dos soldadores da indústria informados pelo Instituto Econômico (Datafolha), que monitora o mercado de trabalho oficial” (fl. 152). Ao assim proceder, contudo, acabou por afrontar expressa disposição da Lei n. 10.559/2002, diante da existência de informação fornecida pelo órgão sindical.
Em amparo ao entendimento adotado, transcrevo o aresto que se segue:
ADMINISTRATIVO. ANISTIA. DANOS MATERIAIS. INDENIZAÇÃO. VALOR. ARBITRAMENTO. CARÁTER SUBSIDIÁRIO. CASO PARADIGMA. ADEQUAÇÃO.
- No art. 6º, caput, a Lei 10.559/2002 estabelece que “o valor da prestação mensal, permanente e continuada, será igual ao da remuneração que o anistiado político receberia se na ativa estivesse, considerada a graduação a que teria direito, obedecidos os prazos para promoção previstos nas leis e regulamentos vigentes, e asseguradas as promoções ao oficialato, independentemente de requisitos e condições, respeitadas as características e peculiaridades dos regimes jurídicos dos servidores públicos civis e dos militares, e, se necessário, considerando-se os seus paradigmas”. No parágrafo primeiro do mencionado dispositivo está previsto que “o valor da prestação mensal, permanente e continuada, será estabelecido conforme os elementos de prova oferecidos pelo requerente, informações de órgãos oficiais, bem como de fundações, empresas públicas ou privadas, ou empresas mistas sob controle estatal, ordens, sindicatos ou conselhos profissionais a que o anistiado político estava vinculado ao sofrer a punição, podendo ser arbitrado até mesmo com base em pesquisa de mercado”.
- É perceptível do texto legal supra que a fixação de indenização por arbitramento dá-se de forma supletiva, quando inviável a obtenção do valor da remuneração do anistiado a partir dos elementos fornecidos pelas partes ou pelas informações prestadas por órgãos públicos, empresas públicas, privadas ou mistas sob o controle estatal, ordens, sindicatos ou conselhos profissionais.
- Ao deferir pensão ao apelado, a Comissão de Anistia declara que: a) “optou por utilizar como critério para fixação do valor da reparação econômica, nos termos da parte final do § 1º do art. 6º da Lei 10.559/2002, os valores salariais médios informados pelos institutos de pesquisas que monitoram o mercado de trabalho (Ex. Datafolha), tendo em vista que, conforme acordo coletivo de trabalho, enviado pela empresa General Motors do Brasil S/A, de São José dos Campos/SP, com vigência de 01 de setembro de 2007 a 01 de agosto de 2009, não há plano formal de progressão funcional”; b) “o anistiando laborava na função de Ferramenteiro Especializado, profissão esta que não consta da listagem da pesquisa de mercado do Datafolha”; c) “a função que mais se assemelha é a de Ferramenteiro, cujo valor médio é no importe de R$ 3.332,00”.
- A mencionada decisão da Comissão de Anistia afrontou a Lei n. 10.559/2002, na medida em que desconsiderou informação do Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos e Região na qual é revelado que, tomando-se por base caso paradigmático, o anistiado possivelmente alcançaria a função de supervisor de ferramentaria, com remuneração de R$ 8.708,86.
- Embora inexista plano de progressão funcional na empresa em que o anistiado laborava antes de ser injustamente demitido – por conta de participação em movimento paredista, em condições normais, poderia ter alcançado a função de supervisor de ferramentaria, conforme se observa do caso paradigma.
- Apelação e remessa oficial a que se nega provimento.
(AC n. 0027137-59.2009.4.01.3400/DF – Relator Desembargador Federal João Batista Moreira – Relator Convocado Juiz Federal Carlos Eduardo Castro Martins – e-DJF1 de 22.06.2012, p. 600)
No que se refere à retroatividade dos efeitos da reparação econômica, deve ser considerada a data estabelecida pela própria Comissão de Anistia, 12.01.1989 (fl. 153), em conformidade com o art. 6º, § 6º, da Lei 10.559/2002, que limitou os efeitos da reparação econômica, estabelecendo como início da retroatividade e da prescrição quinquenal a data do protocolo da petição ou requerimento inicial de anistia (AC n. 0023640-57.2011.4.01.3500/GO – Relator Desembargador Federal Néviton Guedes – Relatora Convocada Juíza Federal Daniele Maranhão Costa – e-DJF1 de 13.07.2016).
Indefiro o pedido de concessão da tutela de urgência. De acordo com o art. 300 do novo CPC a tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. Na hipótese, não vejo configurados o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo, à consideração de que o autor já foi beneficiado pela decisão administrativa, por mérito da qual percebe os valores indenizatórios então determinados. Além disso, é notório que a União detém iniludível capacidade de solvência e seus débitos estão sujeitos ao regime de precatório (art. 100, § 1º, da Constituição Federal).
Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação do autor, para afastar a incidência da prescrição prevista no art. 1º do Decreto n. 20.910/1932, que deve ser aplicada somente em relação às parcelas vencidas no quinquênio anterior à propositura desta ação; para reconhecer ao autor o direito ao recebimento da pensão mensal, permanente e continuada, e, de acordo com as informações prestadas pelo ente sindical, fixar o valor referente aos danos morais em R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais), e para determinar que os efeitos da reparação econômica retroajam a 12.01.1989, conforme deliberado pela própria Comissão de Anistia.
Condeno a União ao pagamento de honorários advocatícios, que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do art. 85, § 3º, inciso I, do CPC de 2015, visto que a parte autora decaiu de parte mínima do pedido.
Não há custas a restituir, pois o demandante litigou sob o pálio da justiça gratuita.
É o meu voto.
Des. Federal DANIEL PAES RIBEIRO
Relator