A TMLD Advocacia alcançou vitória para corrigir valor de prestação mensal, permanente e continuada, de anistia. Com essa conquista, foi afastado o critério de pesquisa de mercado (salariômetro) e o valor será fixado de acordo com os parâmetros oficiais próprios da carreira do anistiado.
A sentença teve a seguinte fundamentação:
Processo N° 0062259-94.2013.4.01.3400 – 13ª VARA – BRASÍLIA
S E N T E N Ç A
Trata-se de ação cognitiva ajuizada por (nome omitido) em desfavor da UNIÃO FEDERAL, objetivando: f.1) a correção da prestação mensal, permanente e continuada do Autor, de acordo com os rendimentos devidos aos servidores submetidos ao regime de 40 (quarenta) horas semanais, correspondentes à especialidade Técnico Administrativo do cargo de Técnico em Saúde da Carreira Assistência Pública à Saúde do Distrito Federal, posicionado na referência TS-05 (Técnico em Saúde, Classe Especial, Padrão V); f.2) o recebimento dos valores retroativos desde 23/11/2000, com base nos rendimentos devidos aos servidores submetidos ao regime de 40 (quarenta) horas semanais, correspondentes ao cargo em questão (fl. 13).
Relata, em síntese, que foi declarado anistiado político, nos termos da Portaria nº 958/2013 do Ministério da Justiça, tendo direito ao recebimento de remuneração no valor equivalente àquele devido ao servidor em atividade, levando em conta a evolução funcional que teria alcançado no quadro da Secretaria de Saúde do Distrito Federal.
Aduz que a administração lançou mão de critérios genéricos, arbitramento por pesquisa de mercado, para fixar o valor da remuneração a ser paga ao autor, conforme Ofício nº 966/2010-CA/GT –Diligência – MJ. Sustenta que devem ser consideradas as informações prestadas pela Secretaria de Saúde para a fixação da prestação mensal a ser recebida pelo autor, observando-se os rendimentos dos servidores submetidos ao regime de 40 (quarenta) horas semanais, correspondentes à especialidade Técnico Administrativo do cargo de Técnico em Saúde da Carreira Assistência Pública à Saúde do Distrito Federal, posicionados na referência TS-05 (Técnico em Saúde, Classe Especial, Padrão V).
A inicial veio acompanhada de procuração e dos documentos de fls. 15/71.
Requer gratuidade da justiça.
Pedido de antecipação de tutela indeferido (fls. 73/74), contudo, deferida Justiça Gratuita.
A União contestou o feito (fls. 81/92), suscitando, como preliminares, a impossibilidade jurídica do pedido e falta de interesse processual, tendo em vista a formulação de pedido administrativo que já foi devidamente julgado. Afirma ser da competência exclusiva do Ministro da Justiça a análise da condição de anistiado. Como prejudicial, arguiu prescrição do fundo do direito e quinquenal.
No mérito, propriamente dito, alega que o Autor não recorreu da decisão que estabeleceu a indenização no processo de anistia; que, para a fixação do quantum indenizatório, foi seguido o padrão fixado pela Lei nº 10.559/02 e que a Comissão de Anistia tem a prerrogativa de fixar o valor da prestação mensal após a análise de elementos de prova constantes dos autos administrativos. Colacionou documentos (fls.93/110).
Réplica (fls. 115/126).
Sem mais provas.
É O RELATÓRIO. DECIDO.
Preliminar
No que tange à preliminar de falta de interesse de agir, realmente não compete ao Poder Judiciário imiscuir-se em matéria afeta primacialmente à esfera de atribuições do Poder Executivo, que detém a prerrogativa de decidir os requerimentos de anistia, à luz dos pressupostos autorizadores da medida, sob pena de afronta ao princípio da separação dos poderes, reservando-se à revisão jurisdicional, essencialmente, o controle de legalidade ou mesmo a correção de flagrantes equívocos que ocasionem prejuízo ao interessado.
No caso em apreço, o demandante sustenta a ocorrência de erro administrativo na fixação do valor da prestação. Cuida-se, pois, de insurgência contra pronunciamento administrativo.
Afasto, pois, a preliminar aludida.
Prejudicial de mérito – prescrição
Quanto à prejudicial de mérito relativa à prescrição, convém registrar que o Código Civil não regula a prescrição contra ou a favor da Fazenda Pública, mas o Decreto nº 20.910/1932. Também é digno de nota que não incide prescrição sobre o pedido de reparação de danos experimentados em razão do regime de exceção que governou o Brasil entre 1964 e 1986, conforme pacífico entendimento da Corte Superior de Justiça.
No entanto, é possível, sim, a incidência da prescrição em relação a requerimento de revisão de ato de anistia, pois não se trata mais de pedido de reparação dos danos, mas de correção de ato administrativo já praticado. Nesse caso, a prescrição é de cinco anos, incidindo a Súmula nº 85-STJ, caso seja hipótese de prestações de trato sucessivo, como no presente caso. Mérito Pretende o Autor obter a revisão das prestações mensais continuadas (remuneração permanente) que recebe a título de anistia, bem como parcelas retroativas desde 23/11/2000, ao argumento de que referidas prestações não foram calculadas corretamente.
Sustenta que ocupava o cargo de Técnico em Saúde, especialidade Técnico Administrativo da Secretaria de Saúde do DF, quando perdeu sua atividade laboral, e que, a despeito de ter obtido a concessão de reparação econômica de caráter indenizatório correspondente ao cargo que exercia, em prestação mensal, permanente e continuada, a Comissão de Anistia não observou a evolução funcional.
Colacionou cópia do Ofício expedido pela Secretaria de Saúde do DF, no qual consta tabela com a evolução salarial do Autor, acaso houvesse continuado integrado ao Quadro de Pessoal daquela Secretaria (fls. 59/61), elaborada pela própria Secretaria.
Sobre o valor da prestação, o órgão em referência assim se manifestou (fls. 47/52):
“18. Neste diapasão, adoto como valor da reparação econômica, em prestação mensal, permanente e continuada, por arbitramento de acordo com o critério da pesquisa de mercado, o montante de R$ 2.354,00 (dois mil, trezentos e cinquenta e quatro reais) referente ao cargo de assistente administrativo do Salariômetro, em concordância com o enquadramento funcional feito em declaração do próprio Governo do Distrito Federal. […]” Apesar de o diploma não definir critério único para o arbitramento da indenização mensal, podendo a Comissão utilizar-se de vários elementos para fixar o valor da prestação, nos termos do § 1º do art. 6º da Lei nº 10.559/2002, deverá o órgão fazê-lo de forma fundamentada. Este pronunciamento administrativo, por óbvio, goza de presunção de legitimidade, que pode ser afastada por densa prova em contrário.
Resta examinar se, no presente caso, o demandante se desincumbiu do ônus de demonstrar o alegado equívoco da Comissão de Anistia.
Da leitura dos termos da decisão acima transcrita, constato que a Comissão de Anistia, embora tenha feito menção aos fundamentos legais e principiológicos, apresentou fundamentação com termos e alusões genéricas, limitando-se a fazer abstrata e muito sucinta remissão aos paradigmas normativos (princípios da moralidade, da eficiência etc.) e a uma dita solução “por arbitramento”. Referida decisão não aponta dados, planilhas ou indicadores concretos que teriam sido utilizados para a projeção da equivalência salarial arbitrada, resumindo-se a informar a realização de pesquisa de mercado e consulta a bancos de dados do “Salariômetro”, “em concordância com o enquadramento funcional feito em declaração do próprio Governo do Distrito Federal” (fl. 51), sem aludir a critérios, referenciais e fontes específicas.
Bem examinada a prova trazida, tenho que os elementos documentais reunidos pelo autor, porque mais específicos e objetivos, são bastantes a afastar parcialmente a presunção de legitimidade do ato impugnado, porque melhor aproveitam à tarefa de estimar a “remuneração que o anistiado político receberia se na ativa estivesse” (Lei 10.559/02 art. 6º, caput), eis que produzidos a partir de “informações de órgãos oficiais, bem como de fundações, empresas públicas ou privadas, ou empresas mistas sob controle estatal, ordens, sindicatos ou conselhos profissionais a que o anistiado político estava vinculado ao sofrer a punição” (Lei 10.559/02 art. 6º, §1º).
Dessa forma, para fins de fixar o montante devido ao autor como indenização mensal, considera-se a tabela contida no Ofício nº 966/2010 (fls. 59/61), a qual registra expressamente que, se estivesse o autor na ativa, teria aquela evolção funcional, daí derivando os específicos efeitos sua remuneração.
Trata-se, enfatize-se, de referência salarial (2010) contemporânea à deliberação administrativa (2012) Registro, outrossim, considerando a comprovação de que o autor foi admitido, no ano de 1969, no regime de 48 horas semanais de jornada de trabalho (fl. 21-v), deve-se aplicar a remuneração correspondente à carga de 40 horas (fl. 61).
Por fim, quanto ao pagamento das parcelas retroativas desde 23/11/2000, é de se esclarecer, como dito antes, que se aplica ao caso a Súmula nº 85/STJ, de modo que lhe serão pagas as parcelas não colhidas pela prescrição, assim consideradas as posteriores (diferença) ao quinquênio antecedente ao ajuizamento da presente ação, que se deu em 23/10/2013 (fl.2).
Tais as razões, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES, nos termos do art. 487, I, do NCPC, os pedidos deduzidos na peça de ingresso, para determinar a revisão da prestação mensal, continuada e permanente percebida pelo autor, que deverá ser fixada no valor equivalente a R$ 4.281,44 (quatro mil, duzentos e oitenta e um reais e quarenta e quatro centavos) (remuneração do cargo de Técnico em Saúde – Técnico Administrativo em 01/09/2010), bem como o pagamento dos valores retroativos (diferença), observada a prescrição quinquenal, na forma da Sumula 85 do STJ, que deverão ser atualizados conforme parâmetros definidos no Manual de Cálculos da Justiça Federal.
Em face da sucumbência recíproca (CPC, art. 86, caput), custas e honorários proporcionalmente distribuídos entre o autor e a União.
Ante a iliquidez da sentença, a fixação dos honorários será promovida por ocasião da liquidação de sentença (art.85, § 4 º, II do NCPC).
Sentença sujeita a reexame necessário (art. 496, I, do NCPC)
Registre-se. Intimem-se. Publique-se.
Brasília-DF, 24 de agosto de 2017.
Juiz Federal Substituto”.