Paulo Saraiva é citado pelo SNI como quem atuou em ações ‘contra a subversão’; ele nega
BRASÍLIA – O ex-sargento do Exército durante o regime militar e advogado e professor de direito em Natal (RN) Paulo Lopo Saraiva, nomeado nesta sexta-feira para integrar a Comissão de Anistia, aparece em documentos do Serviço Nacional de Informação (SNI) como um militar que colaborou com a ditadura. Em depoimentos de militantes de direitos humanos e também no relatório da Comissão da Verdade da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Lopo aparece como uma figura controversa. Como militar, ele serviu na 2ª do Quartel da 7ª Brigada de Infantaria.
Lopo é um dos 19 novos conselheiros da comissão nomeados nesta sexta-feira pelo ministro da Justiça, Alexandre de Moraes.
Num dos informes do SNI, de novembro de 1978, Lopo é descrito como um militar que prestou serviços à ditadura. “Foi sargento do Exército e, na época em que servia no QG da antiga ID/7, desempenhou funções na 2ª seção, antes e depois da Revolução de 31 de março de 64, onde participou de ações contra a subversão, tendo atuado como escrivão de inquérito instaurados para apurar corrupção em prefeituras do interior do estado” – diz o relato do SNI.
Em outro informe do SNI, de 1982, Lopo aparece como alguém que já criticou o regime militar, mas que fez elogios públicos ao governo de João Figueiredo, último general-presidente do ciclo militar. Numa reunião política ocorrida em junho de 1982, no bairro Mãe Luiza, em Natal, ao responder perguntas que lhe eram dirigidas, respondeu: “acredito na abertura do presidente João Figueiredo”. E afirmou também que os direitos humanos tem sido respeitados no país e se algum padre estrangeiro descumpre o Estatuto dos Estrangeiros é um problema da justiça aplicar a lei.
Num outro trecho do relatório, ele aparece como crítico do regime. “Um verdadeiro homem de fibra tem que ser preso, tem que ir para o exílio”. Disse que, enquanto deixarem ele entrar na universidade para dar aula, ele “continuará a mostrar aos alunos a realidade do Brasil”.
No relatório da Comissão da Verdade da UFRN, onde Lopo cursou Direito de 1967 a 1971, quando era sargento do Exército, é citado da seguinte maneira: “Nesse instante (naquele período) as principais lideranças cairiam na clandestinidade, enquanto os diretórios da UFRN passariam a ser preenchidos por forças de direita, representados na figura de Luiz Eduardo Carneiro Costa e Paulo Lopo”.
No livro “A maçonaria e a revolução de 64”, que publicou em 1976, Lopo enaltece o golpe de 1964 e diz que “era mais uma página heroica que os militares escreviam na história da pátria, numa comprovação inconteste da autenticidade do seu gesto ao longo da vida brasileira”.
Juan Almeida, que integrou a Comissão da Verdade da UFRN e é mestrando em Direitos Humanos, diz que o relatório do grupo não chegou a dados conclusivos sobre Paulo Lopo, mas diz que, a a partir de depoimentos de ex-perseguidos políticos prestados à comissão, cartas e documentos oriundos do Arquivo Nacional em Brasília é possível inferir que ele se situava num grupo político distinto daqueles que combatiam o regime militar.
— Uma vez que trabalhando num organismo militar e sendo sargento do Quartel General de Natal gerava desconfianças por parte dos estudantes militantes da Faculdade de Direito da universidade. Além do mais, é possível obter a partir de informativos do extinto Serviço Nacional de Informações que em razão da assunção de função militar, Paulo Lopo colaborou com atividades de repressão aos movimentos dito subversivos — diz Juan Almeida.
Seu nome aparece na relação de “membros da UFRN com atuação política e acadêmica mapeada pelos órgãos de repressão da ditadura militar.”
PAULO LOPO NEGA
O advogado Paulo Logo Saraiva, que hoje tem um escritório de advocacia em Natal, negou ao GLOBO que tenha sido um colaborador dos militares. Confirma que era sargente do Exército em certo período da ditadura, mas disse que nunca atuou contra atos subversivos e que nunca foi escrivão em inquéritos policiais militares que investigaram prefeitos corruptos. Ele disse que desconhece o informe do SNI que cita seu nome e diz que, ao contrário, foi perseguido pelo regime militar.
— Ao contrário disso tudo. Eu era tido como um comunista. Fui conselheiro da OAB. Sou um homem limpo e correto. Fui é perseguido. Sim, fui sargento naquele período, mas não colaborei com nada. Nunca atuei em inquérito. Minhas funções eram outras. Olhe o relatório da Comissão da Verdade — disse Lopo, que afirmou ter sido seminarista e também ter trabalhado pelo impeachment de Fernando Collor de Mello, em 1992.
Num documento de 82, num informes do SNI, há o registro de que Paulo Lopo, em suas aulas na universidade, criticava o governo de todas as formas e que estaria preparando um livro sobre eleições, intitulado “Calvário do povo”. Mas registra uma mudança de posição de Lopo, quando o militar virou secretário Para Assuntos do Governo, na gestão de Lavoisier Maia, da Arena, e que fora nomeado governador pelo presidente Ernesto Geisel, em 1978. “Como foi escolhido e nomeado secretário, vem (Lopo) mudando sua posição e tônica de pronunciamentos”.
O Globo.